Você tem que saber nadar!

TEXTO PUBLICADO EM WWW.PORTALMAMORE.COM.BR

Muito se tem discutido acerca das reformas ortográficas, do papel da escola ao “ensinar” Língua Portuguesa, da não aceitação da linguagem informal.
Recentemente, houve uma discussão “inútil” sobre a inserção do livro didático "Por uma vida melhor", da coleção "Viver, aprender" nas escolas públicas. Neste livro, consideravam-se aceitáveis frases como “Nós pega os peixe”, “Os menino pega os peixe”. Tal aceitação foi o que provocou vários debates de “estudiosos” e emissoras de televisão que alegavam estar havendo a desvalorização da linguagem padrão.
O interessante é que ocorre uma afirmação irrefutável de que é um absurdo a escola dizer que você pode falar “Nós fumo”, pois para muitos, a escola deveria abolir este tipo de fala.
Penso que a língua é como roupa. Você é quem escolhe. É determinada pelo meio em que você vive, os lugares que você frequenta. É uma atitude totalmente subjetiva. Dependendo de sua personalidade você manifesta uma determinada postura linguística.
Discutir se isto ou aquilo é certo ou errado depende muito da situação. È evidente que o papel da escola é oferecer ao aluno uma maneira “diferente e padronizada” de se manifestar linguísticamente e não ensiná-lo a falar, já que, todos os alunos sabem usar a língua portuguesa. O que ocorre é que chegam sem saber algumas REGRAS da linguagem padrão. Dizem frases como “isso é para mim usar” e oferecemos a forma padrão que é “isso é para eu usar”. Elem utilizam se acharem que devem. A opção é deles. E isso não os fará melhores nem piores que aqueles cujos essas regras não conhecem.
Não devemos querer que as pessoas falem um português padrão em todas as situações, pois a linguagem é flexível e adequável.
Imagine se você vai até a padaria e vislumbrado com um belo bolo exclama: _ Dar-me-ia um pedaço deste bolo para que pudesse degustá-lo? Ou se meu pai, com toda sua sabedoria, lá em sua vida pacata na linha 23, no Projeto Sidney Girão, fosse obrigado a falar uma variedade padrão? Sempre brinco que ele “precura” e o melhor é que, mesmo “precurando”, ele acha.
Para Bagno, escritor renomado, que defende a luta contra o preconceito linguístico, essas picuinhas reafirmam uma defesa de uma linguagem que não condiz com a identidade de seus falantes. Imaginem se alguma menina terminaria um namoro porque o namorado a chamou para assistir “o filme” e não “ao filme” como rege a regra de regência? Será que o açougueiro não saberia atender um cliente que pedisse dez real de carne?
O que pretendo frisar aqui, não é a defesa do “nós fumo , nós vai”, mas o respeito ao falante de nossa língua portuguesa. O respeito aos saberes, pois não são úteis em todas as situações, tendo em vista que em caso de um afogamento, de nada me valerá saber as regras de acentuação gráfica, tenho que saber nadar!
O papel da escola e de nós professores não é impor uma maneira de falar, mais sim oferecer aos alunos uma ampliação das competências linguísticas e comunicativas para que os mesmos possam aprender as variedades e, de acordo com as circunstâncias, aplicá-las.
Temos que lhes dar a oportunidade de escolher, pois como disse acima, em algumas situações é inadequado usar este ou aquele tipo de variação. Se um palestrante que falará sobre a aplicação das regras gramaticais cometer desvio da linguagem padrão é inadequado, todavia um professor de língua portuguesa usar expressões retóricas em um espaço informal também é inadequado.
Essa discussão me fez lembrar um trecho de uma música que diz: “ Deixe que digam, que pensem, que falem, deixe isso pra lá, vem pra cá, o que que tem? Eu não tô fazendo nada, você também. Que tal bater um papo assim gostoso com alguém?
A linguagem tem essa magia. E a linguagem despreocupada é ainda mais gostosa: a palavra carinhosa do amigo, os apelidinhos dos casais sussurrados ao pé do ouvido, as palavras de gentileza.
Toda essa troca na hora da comunicação faz como que a linguagem seja um elemento de aproximação. Todavia devemos ter muito cuidado, haja vista que a mesma língua que aproxima pode ser uma poderosa arma de exclusão entre os falantes.

Comentários

  1. Deveria ser postado no UOL Vestibular em Julho xD - Só pra ver que nota levaria.

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