Memórias
transeuntes
I
Pés
da ventania de pertencer
ao
Eucalípto após um frio na tarde de novembro
à
castanheira excelsa de um janeiro qualquer
da
cantoria de uma ornitologia que ecoa nas águas barrentas das minhas margens
de repente, o nambu-chitão atravessa o Jaçanã e
compõem, juntos, a canção da saudade.
De onde?
de um caminho brejeiramente colorido pela terra
que é mãe
que é casa e que compõe a poética do meu espaço
bachelardeano
entre os astros do cruzeiro
onde a vida se engalana
e se arreda da loucura de ser círculo, e não
plana
ingênua esperança de ser raiz destas florestas.
II
Cede à aventura
que dispersa entre as cores do empoeirado
chinelo velho na porta da casa
É tênue
o ritmo que faz balançar esse corpo de
fragmentos inaudíveis
tantas melodias dilatadas pelas pedras de cada
caminho
dos mosaicos
que são mapas
das matas
que são trigais
da velha casa
que
ouvia o tilinto de cada gota de chuva no zinco
III
Deste lado, o sol nasce avisando que o mormaço
é só uma carícia que escalpela a vontade de ser gentes, alii homines
essa vontade de passarinhar por entre a mata
de oca em oca.
O sabiá- barranco, na espreita, avisa que tem
umas pedras muito altas querendo ser rio
o rio é gente grande, arteiro, se arreda com
virulência, ele quer ser mar
ser inteiro, ser todo, ser rio.
Deste lado, a lua chega, ainda clara, ainda
luz, e sopra o segredo da cara pintada de urucum e jenipapo
é lua que deita na rede
que emprenha uma ideia de querer ser só
de mergulhar na água derramada misturada nas
vozes
e com uma quentura do sol, temperar a luz,
que nasce em uma prosa cheia de poesia no
barranco.
IV
A gente tem que virar semente onde vai nascer
árvore
e não ser queimado para virar cinzas no mar
queria ser planta de igarapé
quem sabe um dia broto buriti
caio no rio
broto jatuarana
broto sucuri
broto lua e fico, bem do alto, sendo rima de
fotografia
que chora na saudade
de não ser nada, de não ser tudo, de não ser
onde
Daqui, de acolá
ser das cachoeiras e dos milharais.
É tempo de desintegrar os verbos da memória
ir com as lavadeiras bater roupa
ler na biblioteca da escola
correr pela
ditosas leiras com o nariz cheio de poeira
jogar bola na rua para rasgar o calcanhar
enquanto a mãe não chega
chorar pelo irmão que se foi
embalar a saudade que mora aqui na camisa
vermelha
nascer em um novembro qualquer, em um lugar
qualquer sob um mesmo sol de tantos outros trânsitos.
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